Educação do Campo: um espaço em disputa

(Imagem: Internet)
Coluna Letrados
Por: Sueli Valiato – Professora de Língua Portuguesa

Caríssimo (a) leitor (a), convido-te para um diálogo sobre uma questão de extrema importância, no cenário da Educação Brasileira e para a dignidade dos povos do campo: a disputa pelo domínio do modelo formativo/pedagógico da Educação do Campo. Então, vamos lá?!

A disputa do espaço da Educação do Campo se acirra a cada dia. A disputa pelo domínio do modelo formativo que essa modalidade de ensino deve ofertar. Disputa essa, que é protagonizada por modelos antagônicos de desenvolvimento para o campo, no campo, do campo, sobretudo, entre o agronegócio e a agricultura camponesa.

O campo brasileiro constitui territórios com modo próprio de vida social, utilização do espaço,  identidades peculiares e diversas, com direitos fundamentais e inserção e participação cidadã na definição dos rumos da sociedade, de acordo com as Diretrizes Nacionais da Educação do Campo, homologada em março de 2002,  tendo em vista o disposto na Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 LDB, na Lei nº 9.424, de 24 de dezembro de 1996, e na Lei nº 10.172, de 9 de janeiro de 2001, que aprova o Plano Nacional de Educação, e no Parecer  CNE/CEB 36/2001.

Neste contexto de disputa, é importante ressaltar que as Diretrizes Nacionais da Educação do Campo é fruto da luta dos povos do campo. É um conjunto de princípios, de procedimentos escritos com o objetivo de assegurar o projeto institucional das escolas do campo em relação as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil, o Ensino Fundamental e Médio, a Educação de Jovens e Adultos, a Educação Especial, a Educação Indígena, a Educação Profissional de Nível Técnico e a Formação de Professores, reconhecendo e consolidando a identidade da Educação do Campo.

Nenhuma educação escolar deve se constituir em processos, métodos e metodologias desconectados das realidades dos territórios. Tampouco, na educação do Campo, uma vez que há princípios que a fundamenta, com a perspectiva de que o espaço e o currículo escolar transcendem os muros, as casas, as cercas… Na construção de uma educação própria e apropriada, onde a realidade concreta é o ponto de partida para o desenvolvimento dos diversos conhecimentos, numa práxis em que todos ensinam e todos aprendem, em diferentes contextos, espaços e tempos. Na Educação do Campo não cabem padronizações, aplicações de pacotes educacionais pensados para outros territórios.

Estamos vivendo uma disputa silenciosa, em que projetos educacionais que protagonizaram, nortearam e referenciaram os grandes debates e conquistas da Educação do Campo no Brasil, estão sendo asfixiados pelo excesso de controle, vigilância e interferências abruptas, que requerem, dia após dia, ações de reducionismos e superficialidade para fazer-se caber num sistema de educação verticalizado e adestramento do saber, a pretexto de custeios e investimentos, que já são diretos garantidos na Constituição Federal, dentro os quais cito: as Escolas Comunitárias, as Escola Famílias Agrícolas e Escolas de Assentamentos do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra.

Educação do Campo é modalidade de ensino no Brasil. É direito! Não deve ser usada como moeda de troca!

Nós, povos do campo, estamos há décadas construindo, “a muitas mãos”, modelos educacionais emancipatórios, enraizados na realidade e saberes dos territórios do campo, que defendam um currículo que valoriza as dimensões culturais, sociais e políticas do campo, a soberania alimentar que discutam e incentivem padrões desenvolvimento sustentáveis, a produção associados à agroecologia e à reforma agrária.

Nos últimos anos, a Educação do Campo, está permeada por modelos educacionais que reproduzem a lógica hegemônica e comercial do agronegócio, que tem direcionado a práxis pedagógica à homogeneização do currículo e ao menosprezo dos saberes e da cultura dos povos do campo.  Focado num currículo tradicional, superficial, voltado modelo de desenvolvimento que referencia a produção em larga escala, que aos poucos vai  marginalizando a agricultura familiar e camponesa e os modos de vida dos territórios do campo.

A disputa pelo domínio do espaço da Educação do Campo é estratégia de outra disputa maior, por projetos de desenvolvimento do país, que também está ocorrendo na sociedade como um todo. A disputa entre projetos antagônicos de desenvolvimento e de sociedade, em que o  Estado e grandes empresas buscam se apropriar até do  conceito: “Educação do Campo” para legitimar práticas que certamente esvaziarão seu caráter revolucionário, para reforçar a alienação, a dominação e a desigualdade social.

*O texto é de livre pensamento da colunista*
Sueli Valiato – *Reside em Jaguaré *Graduada em Letras – Licenciatura Plena em Língua Portuguesa e Literatura de Língua Portuguesa, pela UFES; *Pós-graduada em Educação do Campo pela FANORTE; professora de Língua Portuguesa no Ensino Fundamental II, no CEFFA de Japira, em Jaguaré-ES, integrante da Coordenação Geral e da Coordenação de Plano de Curso da RACEFFAES. / Foto: Divulgação.

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Respostas de 4

  1. A Educação do Campo é uma grande conquista para o camponês. É uma educação voltada para as nossas necessidades e expectativas. Tem sido uma luta constante pelo reconhecimento desse direito. Sueli se destaca nessa luta, é uma guerreira, mulher de fibra que leva a finco a missão de educadora.

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