Professor e Me. Samuel J. Messias. / Foto: Divulgação.
A educação, em seu sentido mais amplo, enfrenta acentuados problemas de qualidade e ainda não alcançou patamares desejáveis de democratização. A aliança entre o capital monopolista, representado pela burguesia nacional, internacional e o Estado, faz com que os trabalhadores do campo respondam com o fortalecimento de suas organizações. Ao lado das Ligas Camponesas é criado a entidade ULTAB (União dos Lavradores e Trabalhadores Agrícolas do Brasil), importante agente na organização política popular no campo gaúcho, a partir da década de 1950; outra frente do movimento rural é o MASTER (Movimento dos Agricultores Sem Terra), criado em 24 de junho de 1960, na cidade de Encruzilhada do Sul (RS) e, por fim a CONTAG (Confederação Nacional dos Trabalhadores em Agricultura), em 1962.
A luta no campo, nesse momento, possuía duas diretrizes: luta por melhores condições de trabalho e luta por terra. (ALMEIDA, 1996). Brandão nos ensina que para pensar a Educação é preciso considerar o educador como educador, aquele que exerce troca de saberes, um profissional especializado em não permitir que aquilo que deve ser conhecido fique restrito a esfera de senhores do saber.
Por isso essa troca de saberes que as pessoas realizam quando se encontram na educação é um poder e não uma instituição social, como por exemplo a praça de uma cidade – Sócrates terá sido o primeiro a descobrir isto? – Ela é um contexto, um lugar cultural, um cenário onde pessoas se aproximam e interagem para trocarem o que sabem. Isto é, o que são. (BRANDÃO, 2009).
Estas questões específicas, entrelaçadas com a realidade dos sujeitos que trabalham diretamente com a terra, deveriam ser substituídas por novos padrões de ser, de pensar, de cultivar, de trabalhar. Estes novos padrões, por sua vez, deviam ser difundidos nas escolas. Portanto, deveriam constituir a base dos cursos de formação dos educadores do campo, transformando estes em agentes de difusão dos padrões dominantes, amparada nas novas formas de produção e na incessante necessidade de aumento da produção.
Desta forma, afirma-se que é preciso que um projeto transformador de educação do campo e de formação de educadores esteja diretamente relacionado a um projeto transformador de sociedade. Caso contrário, toda ação não passaria de reforma de questões específicas de uma realidade contraditória, corrigindo um detalhe defeituoso da ordem estabelecida, de forma que sejam mantidas intactas as determinações estruturais fundamentais da sociedade como um todo.
Desafios
Existe, e de forma pouco velada, o preconceito de que o homem do campo é atrasado. Esse é um preconceito histórico que herdamos dos tempos do Brasil Colonial e Imperial, do trabalho rural exercido pelos escravos. Educação rural é uma educação definida pelas elites rurais, uma vez que entendemos que cada classe social procura impor a sua educação, a fim de manter o status quo, para os sujeitos do campo. Em sua essência é:
Uma educação veicula uma concepção “urbano-cêntrica” de vida e desenvolvimento, a qual dissemina um entendimento generalizado de que o espaço urbano é superior ao meio rural, de que a vida na cidade oferece o acesso a todos os bens e serviços públicos, de que a cidade é o lugar do desenvolvimento, da tecnologia e do futuro, enquanto o meio rural é o lugar do atraso, da ignorância, da pobreza e da falta de condições mínimas de sobrevivência. Uma educação que não leva em consideração os conhecimentos que os educandos trazem de suas experiências e de suas famílias. Uma educação que desvaloriza a vida do campo, diminuindo a autoestima dos educandos e descaracterizando suas identidades. Uma educação que fortalece o ciclo vicioso que os sujeitos do campo realizam: “de estudar para sair do campo” ou “de sair do campo para estudar”, fortalecendo o processo de migração campo-cidade. Uma educação que se constitui enquanto um instrumento de reprodução e expansão da estrutura agrária e de uma sociedade excludente. (HEGE, 2005).
Educação do Campo se realiza no conjunto dos Movimentos Sociais, nas lutas pela terra, por condições dignas de vida, e, pela afirmação de sua identidade, que o povo do campo tem realizado.
A educação rural vai se constituir numa ação “compensatória”, pois “trata os sujeitos do campo como incapazes de tomar suas próprias decisões.” Entende-se que estes “são sujeitos que apresentam limitações, em função das poucas oportunidades que tiveram em sua vida e do pouco conhecimento que tem.” (HAGE, p.14.2005)
Enquanto que a Educação do Campo deve se constituir em uma ação “emancipatória”, que tem por objetivo incentivar os sujeitos do campo a pensarem e agirem por si próprios, assumindo sua condição de sujeitos da aprendizagem, do trabalho e da cultura, pois emancipar significa romper com a tutela de outrem, significa ter a possibilidade de tomar suas próprias decisões, segundo seus interesses e necessidades, entendendo que as populações do campo têm o direito de definir seus próprios caminhos, suas intencionalidades, seus horizontes. (HAGE, p.15. 2005)
De acordo com a concepção de educação rural, a educação deve ser dada aos indivíduos para suprir suas carências mais elementares, deve funcionar como uma Educação supletiva, em que se transmite a cada indivíduo somente os conhecimentos básicos, pois se acredita não ser necessário aos sujeitos do campo, que lidam com a roça, aprender conhecimentos complexos, que desenvolvam sua capacidade intelectual. Assim a educação passa a ser vista como um favor e não como um direito. (HAGE p. 15.2005)
Este não é um conceito que já está pronto e muito menos fechado, mas, sim, um conceito em movimento que vem sendo construído nas últimas décadas, principalmente a partir de práticas e de relações pedagógicas que estão sendo operacionalizadas neste tempo e espaço histórico: “a sociedade brasileira atual e a dinâmica específica que envolve os sujeitos sociais do campo”. (CALDART, P.15.2009). Ou seja, a Educação do Campo se realiza no conjunto dos Movimentos Sociais, nas lutas pela terra, por condições dignas de vida, e, pela afirmação de sua identidade, que o povo do campo tem realizado.
Este conceito é definido coletivamente pelos sujeitos do campo. É uma educação que não se faz sem ou para os sujeitos do campo, mas com os sujeitos do campo, como já salientou Caldart. Nessa educação a discussão sobre o campo e seus desafios precede a discussão sobre educação, entendendo o campo como o lugar onde vivem, onde trabalham, onde produzem cultura, onde se relacionam os sujeitos do campo.
Deve ser uma educação entendida não como um fim em si mesma, mas como um instrumento de construção da hegemonia de um projeto de sociedade: includente, democrática e plural. (HAGE p.18.2005).
É preciso reconhecer que no campo existe uma pluralidade de sujeitos, tais como assentados, acampados, índios, quilombolas, trabalhadores assalariados, que podem e devem conviver numa relação dialógica e fraterna. Para isso é preciso que a educação seja um projeto da classe trabalhadora do campo para todas as pessoas que estão no campo. Uma educação que contribui para a construção de outra relação entre o campo e a cidade, enfrentando a hierarquia e a desigualdade atualmente existentes. A instituição escolar como espaço de acesso ao saber formal, observamos que:
- (…) no campo ela introduz na experiência educativa elementos culturais e perspectivas de vida diferentes daqueles do universo camponês, o que favorece a própria negação desse universo, seu esvaziamento cultural e simbólico, provocado pela expressão de sentimentos e valores que não fazem parte da socialização para o mundo rural. Nesse espaço em que o indivíduo reelabora a maneira de expressar sua natureza pessoal e social, esses homens e mulheres são levados a assimilar outros referenciais culturais, no bojo dos conhecimentos que adquirem. (BELTRAME, p.18.2009). Sendo assim, a escola vai enfrentar resistência dos sujeitos do campo, uma vez que…
- (…) a “mensagem” da escola não se integra num esquema de necessidades vitais ao homem que trabalha e vive no campo. A integração efetiva da escola com as necessidades vitais do sujeito só ocorre quando ele se propõe a migração para a cidade ou se envolve com relações materialmente significativas de caráter urbano (…). (BELTRAME, p.19, 2009)
Em se tratando especificamente da educação do campo, Fernandes e Molina (2004, p. 64) destacam a emergência de um novo paradigma como sendo resultado do conjunto de práticas pedagógicas desenvolvidas por diferentes movimentos sociais.
O povo tem o direito a uma educação pensada desde o seu lugar
Percebe-se que nos dias atuais a educação do campo tem sido mais valorizada devido às mudanças cabíveis de acordo com as necessidades da família rural. As escolas estão usando os conhecimentos adquiridos pelos alunos para montar seus planos de aula, fazendo com que aja uma aprendizagem a partir dos conhecimentos adquiridos pelos mesmos, sendo que a modernidade e a tecnologia já chegaram até o campo fazendo com que a família da zona rural tenha uma vida melhor com qualidade de vida, com isso a forma de pensar e a socialização com as pessoas da cidade se tornou mais diligente.
A educação seria o meio mais eficaz, para Durkheim (1955), “tirar da criança a condição de tábua rasa e transformá-la em um ser social”. O processo de socialização é também fundamental para se analisar o papel da escola na sociedade. Sendo assim, a educação voltada para a educação do campo deve ser de qualidade visando à socialização do educando, tirando este paradigma que as pessoas do campo são jacus, tímidos e sem cultura. Podemos perceber que os espaços pedagógicos de formação não ocorrem apenas em sala de aula, mas também na família, na convivência social, cultural, nos serviços de produção de conhecimento, entre outros.
Nesta perspectiva de aproximação do meio escolar e do meio familiar/produtivo organiza-se o movimento de vai-e-vem entre a prática e a reflexão teórica, movimento este que constitui um dos fundamentos da alternância que, assume sentido de estratégia de escolarização, possibilitando aos jovens que vivem no campo, conjugar a formação escolar com as atividades e tarefas da unidade produtiva familiar, sem desvincular-se da família e da cultura do meio rural. (QUEIROZ, 2004, p.35).
Devemos pensar o mundo a partir do lugar que vivemos, desta forma, construímos nossas identidades, fortalecemos e formamos nossa cultura. Nessa lógica, valorizar e preservar as culturas locais, a partir da educação, seria um dos 10 pontos para defesa desse território imaterial e garantir a manutenção do território material onde se dá a produção e reprodução da vida. A questão da educação do campo no Brasil sempre foi um desafio a ser vencido. Os problemas que surgem da realidade socioeconômica influência a concepção de educação que é oferecida aos povos do campo. Caldart (2002) apresenta a Educação do Campo como:
[…] a luta do povo do campo por políticas públicas que garantam o seu direito à educação, e a uma educação que seja no e do campo. No: o povo tem direito a ser educado no lugar onde vive; Do: o povo tem direito a uma educação pensada desde o seu lugar e com a sua participação, vinculada à sua cultura e às suas necessidades humanas e sociais. (2002, p.26).
Portanto, o educador do campo deve ser aquele que contribui com o processo de desenvolvimento para uma aprendizagem de qualitativa, construindo conhecimentos a partir da realidade vivida por eles. Por isso, ele deve se adequar a realidade deste povo para trabalhar a aprendizagem por meio de histórias construídas com suas lutas pela igualdade, educação, cultura e dignidade pela vida.
Desse modo, a escola que temos seja a escola que queremos, a qual precisamos, e, faz-se necessário o engajamento dos educadores, bem como, inventar meios de ensinar de forma lúdica, que desperte nos alunos o gosto por estudar. Fazendo com que os mesmos desenvolvam o senso crítico e apto para viverem em uma sociedade com igualdade. A luta pela Educação do campo é um movimento histórico, pois por meio da educação se estabelece uma ponte do meio rural para o meio urbano. Por isso, a necessidade de adotar medidas cada vez mais fortes para que as lutas do povo do campo não sejam em vão. Portanto, para trabalhar com os alunos do campo é preciso não só ter conhecimentos científicos, mas é preciso conhecer a realidade local, as famílias que lutam por sobrevivência e qualidade de vida. Elaborar projetos para trabalhar com as famílias, a identidade do homem do campo entre outros. Usar metodologias de acordo com a realidade local, buscando resgatar experiências vividas pelo povo e assim fazer da educação algo inovador.
Penso que todo o sistema pedagógico precisa de formações periódicas e continuadas para entregarem a comunidade da educação do campo tudo aquilo que foi sonhado, construído e desenvolvido ao logo do seu processo histórico, proporcionando assim o desenvolvimento humano, institucional e a emancipatório.
Samuel J. Messias – *Mestre em Educação ( Florida University- USA) – *MBA em Estratégia Empresarial – *Especialista em Políticas Públicas – *Especialista em PNL – *Especialista em Empreendedorismo Circular – *Gerente de Projetos Especiais na ADERES – *Prof. Convidado na Florida University – USA.