Cultura
Por: José Salucci – Jornalista
No mês em que se intensifica a reflexão sobre a Consciência Negra, um momento vital de diálogo, memória e celebração da história e cultura dos povos africanos e afro-brasileiros, a Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio (EEEFM) João Neiva e a Banda de Congo São Benedito de João Neiva uniram forças em um ato que reverberou a luta pela equidade racial. O encontro cultural ocorreu na última terça-feira (18), nas dependências da instituição educacional.
Com o foco voltado para uma educação antirracista, a escola baseia sua iniciativa na Lei $10.639/03$, que alterou a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) para tornar obrigatório o ensino da história e cultura afro-brasileira em todo o currículo do ensino fundamental e médio, tanto na rede pública quanto na privada.
Congo no currículo: sabedoria popular como conteúdo acadêmico
Com o intuito de trabalhar a temática de forma interdisciplinar, permeando todo o currículo e indo além das datas comemorativas, a EEEFM João Neiva convidou a Banda de Congo São Benedito para celebrar a potência do dia 20 de novembro – Dia da Consciência Negra. A proposta central é promover a equidade, identificar e reverter a naturalização de estruturas e comportamentos racistas e preconceituosos que, infelizmente, persistem no ambiente escolar e na sociedade.
A professora Rachel da Vitória Batista, da disciplina de Química e que também atua como Professora Coordenadora de Inovação (PCI), detalha o trabalho desenvolvido em conjunto com os demais docentes da Educação de Jovens e Adultos (EJA).
“Neste segundo semestre, desenvolvemos trabalhos interdisciplinares com os estudantes da EJA, todos sob a temática Consciência Negra. E, para finalizar este ciclo de atividades, convidamos a Banda de Congo São Benedito de João Neiva”, explica a docente.
Ela enfatiza a riqueza desse intercâmbio: “Nossos alunos trazem consigo uma bagagem de vida riquíssima. Trazer o congo é reconhecer e validar a cultura popular que muitos deles vivenciam, transformando a sala de aula em um espaço de memória, identidade e pertencimento.”
A professora complementa, destacando a relevância pedagógica da iniciativa: “Dessa forma, ao trazer a Banda de Congo, a escola não está apenas mostrando a cultura; estamos validando a sabedoria e a arte dos mais velhos, transformando o saber popular em conteúdo acadêmico.”
O capitão da Banda de Congo, Celso Corrêa, expressou a emoção do grupo:
“É muito gratificante fazer parte de um grupo e viver a cultura da banda de congo, representando nossa cor, raça e tradição. Isso destaca a luta da população negra, reconhece nossa contribuição e reforça a necessidade de políticas públicas voltadas à igualdade racial.”
História, ancestralidade e a chama familiar do congo
A história da Banda de Congo São Benedito se entrelaça com a ancestralidade e o amor familiar. Sua presidente, Maria Izabel Barreto dos Santos, de 69 anos, carrega consigo essa rica herança afro-brasileira. Desde os cinco anos de idade, ela percorre o universo musical do congo, sendo filha de Cândido Marins Barreto, o primeiro presidente da Banda de Congo São Benedito do bairro Cruzeiro.
“Presido esta banda de Congo com muito orgulho, com muito amor, porque foi algo que meu pai me passou desde a minha infância. Foi um pedido que ele me fez, para que na ausência dele eu desse seguimento a esta cultura, a esta coisa que ele tanto amava e à qual ele tanto se dedicou”, emociona-se a presidente, que está no cargo desde 17 de outubro de 2021.
Izabel relata sua comoção ao citar a visibilidade de outras manifestações culturais no município. Sem agir em detrimento das culturas italiana e alemã, ela reflete sobre a representatividade negra em João Neiva: “Outras culturas estão sendo muito faladas no nosso município, mas a do negro, a gente quase não ouve falar. Então, essa data de 20 de novembro é dedicada à Consciência Negra.”
Ela ainda destaca a perenidade da luta: “Falar de consciência negra é falar sempre; é respeitar o direito do negro, do povo negro que tanto lutou neste país, neste Brasil, sofrendo, lutando, apanhando, sendo escravizados.” A presidente conclui, prometendo a perpetuação da cultura: “Aqui no nosso município, enquanto vida eu tiver, vou estar aí na banda de Congo lutando, levando essa cultura a todos os cantos.”
A presidente também faz um apelo ao poder público municipal. Ela ressalta que encontros de bandas de congo acontecem em outros municípios do Espírito Santo, como Linhares e Serra.
“É o meu sonho realizar essa festa de encontros de bandas de Congo do Estado aqui no nosso município. A Consciência Negra, este ano, não teve nada de especial feito aqui. Nós participamos em Ibiraçu, em Alto Piabas, em uma festa muito bonita, com união de todos, falando sobre a cultura do Congo”, conclui.
O capitão Celso Corrêa reforçou a luta diária da população negra e a necessidade de reconhecimento, mencionando a disparidade com outras festas que têm destaque garantido:
“Infelizmente, a questão racial faz com que nós, negros, fiquemos em segundo plano, mas a proposta é estar presente em todos os momentos e em todos os lugares, e termos nossas grandiosas comemorações em destaque.”





