“Help!”: música, filme e álbum

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Coluna Letrados
Por: Giovandre Silvatece – Roteirista

Olá, leitor(a) da coluna Letrados! Há sessenta anos, os Beatles lançavam a música “Help!”, como também o filme e o álbum homônimos. Apesar de ter sido escrita por encomenda para o filme de mesmo título, a música reflete o momento em que John Lennon encontrava-se estressado e esmorecido em face do sucesso avassalador de sua banda em um curto, porém agitado, espaço de tempo.

O filme, cujo título original seria “Eight Arms to Hold You”, foi planejado como forma de promover a banda, como se isso fosse necessário, afinal a Beatlemania havia chegado ao seu ápice um ano antes, e aproveitando aquele momento, Walter Shenson produziu o filme “Os Reis do Iê-Iê-Iê” (A Hard Day’s Night, 1964), uma mistura de ficção e documentário que bem retratou aqueles anos de estrondoso sucesso dos Beatles perante o público, principalmente entre os jovens.

Quanto ao álbum “Help!”, este encerrou a primeira fase do grupo conhecida como Beatlemania, caracterizada por letras e arranjos simples, e com músicas esbanjando energia. Contudo, ainda naquele ano de 1965, os Beatles passariam a compor e gravar músicas com letras mais introspectivas, instrumentalmente diversificadas e melhor elaboradas.

A música: frenesi e melancolia

A canção “Help!” foi gravada em abril de 1965 e lançada como compacto simples em 19 de julho daquele mesmo ano nos EUA, tendo no lado “B” a música “I’m Down”. A canção ficou em primeiro lugar nas paradas de sucesso por três semanas, tanto nos EUA, como no Reino Unido. Além dos instrumentos tradicionais de uma banda de rock, na gravação da música foram utilizados violão de doze cordas e pandeiro.

Apesar do título e a letra refletirem um momento de prostração na vida de Lennon, no intuito de torná-la comercial, a música foi gravada num ritmo frenético, inclusive utilizando-se da técnica de duplicação do vocal principal. E foi dessa forma que a música acabou se tornando um dos maiores sucessos da carreira da banda.

Em meio às inúmeras versões da música, alguns artistas conseguiram captar a carga melancólica da canção, como a banda Deep Puple, Tina Turner e Caetano Veloso, que gravaram versões da música numa batida muito menos acelerada, em consonância com a letra e o estado de espírito de quem a escreveu.

O filme: confusões, influências e videoclipes

O filme “Help!” consiste numa mescla dos gêneros comédia e musical, repleto de confusão e aventura, sendo dirigido por Richard Lester, que havia dirigido o filme anterior dos Beatles, o já mencionado “Reis do Iê-Iê-Iê”.

No elenco, além dos Beatles, havia alguns nomes conhecidos da época, como John Bluthal, que aos 85 anos interpretaria o Professor Marcuse no filme “Ave, César! (Hail, Caesar!, 2016), dos irmãos Coen; Roy Kinnear, que atuaria com Lennon no filme “Como Eu Ganhei a Guerra” (How I Won the War, 1967), e que também fez Henry Salt no filme “A Fantástica Fábrica de Chocolate” (Willy Wonka and the Chocolate Factory, 1971); Victor Spinetti, que participou de três filmes dos Beatles; além da atriz Eleonor Bron, que teve uma participação efetiva no filme, interpretando a alta sacerdotisa Ahme.

O filme inicia com um ritual de sacrifício humano de uma seita religiosa formada por um grupo de indianos, entretanto, ao descobrirem que a mulher que seria oferecida à deusa Kaili estava sem o anel de sacrifício, pois a própria vítima havia dado de presente a Ringo, surge, a partir daí, uma série de peripécias em face da tentativa do grupo religioso procurar reaver o anel que o beatle havia colocado em seu dedo e que não mais conseguia retirar, ao ponto de John e Paul sugerirem que Ringo cortasse o dedo e devolvesse o anel à seita a fim de se livrarem da perseguição.

Na época, o filme obteve críticas mistas e isso permanece até os dias de hoje, contudo, tende a agradar aos fãs dos Beatles, estando muito longe de ser considerado uma obra-prima. O roteiro é um tanto simplório e algumas cenas não esclarecem muito bem o que está acontecendo, sendo que o próprio Lennon disse numa entrevista que houve pouca orientação do diretor quanto à direção do projeto.

Apesar de ter recebido uma verba maior que o filme antecessor, “Help!” não obteve o mesmo sucesso de público e crítica, mas como atrativo teve o fato de ter sido o primeiro filme colorido do grupo, o que culminou na utilização de cenários coloridos e extravagantes, influenciando filmes com temática psicodélica e do gênero fantasia. Essa amplificação da intensidade e exagero das cenas através do uso de elementos visuais também influenciou a indústria publicitária da época.

O filme introduziu um estilo de humor mais abstrato e surreal, o que também teve a sua influência em outros filmes e séries, mas o pioneirismo do filme quanto ao fato das músicas tocadas em “Help!” se configurarem como parte integrante da história, conforme alguns críticos descrevem, não encontra suporte nas letras das músicas, as quais não remetem às situações envolvendo os protagonistas, sendo que as interpretações das músicas pela banda apresentam-se mais como videoclipes, apesar de se configurarem como pontos de destaque do filme.

O álbum: o adeus à simplicidade das músicas do quarteto de Liverpool

Se o filme “Help!” não agradou tanto quanto o antecessor, o álbum liderou as paradas de sucesso por seis semanas nos EUA e por oito no Reino Unido, além de liderar as paradas em diversos outros países, como Suécia, Austrália e Nova Zelândia.

O álbum “Help!” foi lançado no Reino Unido no dia 6 de agosto de 1965, contendo no seu lado “A” todas as músicas visualmente interpretadas pelos Beatles no filme. A música “She’s A Woman” aparece no filme como se estivesse tocando num rádio e não faz parte da trilha sonora contida no disco. No lado “B” foram incluídas outras canções gravadas no primeiro semestre de 1965.

O sucesso do álbum esteve, de fato, atrelado à qualidade das canções nele contidas, como “Ticket to Ride”, “You’re Going to Lose That Girl”, “The Night Before” e You’ve Got to Hide Your Love Away”, além da canção título do álbum e do filme. Como se não bastasse, o lado “B” traz consigo nada mais, nada menos que a clássica “Yesterday”, além de outras boas canções como “I’ve Just Seen a Face” e “It’s Only Love”. Há um consenso de que esse álbum, juntamente com “A Hard Day’s Night”, terceiro álbum da banda, apresentam-se como os melhores dessa primeira fase dos Beatles.

A versão estadunidense do álbum é até mais fiel ao filme, pois, além de conter músicas incidentais, não foram inseridas ao álbum canções que não fazem parte do filme, porém a versão inglesa é aquela que faz parte da discografia oficial dos Beatles.

Ainda que o álbum “Help!” não tenha sido influenciado pelo sucesso do filme para alavancar as suas vendas (é bem possível que o efeito tenha sido o inverso), foi durante as filmagens que George Harrison teve contato com a música indiana, especialmente quando ouviu um sitar sendo tocado em uma das cenas. Assim começa a proximidade dos Beatles com a música indiana, que, por sua vez, motivou a banda a inserir diversos instrumentos musicais raramente, ou nunca, utilizados por uma banda de rock em suas gravações.

Em que pese a utilização da flauta na música “You’ve Got to Hide Your Love Away” pela primeira vez em suas canções, foi no álbum seguinte, Rubber Soul, lançado no final de 1965, que os Beatles passaram, com uma certa frequência, a incluir novos instrumentos em suas músicas, a começar com o próprio sitar, tocado por George em “Norwegian Wood”, além de harmônio e cravo, dentre outras experimentações instrumentais.

O uso de novos instrumentos musicais, bem como novas técnicas de gravação, aliados ao amadurecimento das letras de suas canções, inaugurou uma nova fase dos Beatles. Embora a Beatlemania persistisse, pelo menos até o último show oficial da banda, realizado no Candlestick, em 29 de agosto de 1966, a sua música nunca mais seria a mesma, e isso ocorreria já a partir das primeiras gravações realizadas após o lançamento do álbum “Help!”, o qual marcou o fim de uma era na carreira musical dos quatro rapazes de Liverpool, dando lugar a uma outra que se caracterizaria por uma crescente experimentação vocal e instrumental, além da exploração de novas técnicas de sonorização.

*O texto é de livre pensamento do colunista*


Giovandre Silvatece – *Reside em Vitória/ES *Roteirista *Servidor Público. / (Imagem: Divulgação)

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