Colabore com essa informação! Pix: 47.964.551/0001-39.
Coluna Letrados
Por: Giovandre Silvatece – Roteirista
Olá, leitor(a) da coluna Letrados! Conforme mencionei em artigos anteriores, neste ano de 2025, o Cinema completa 130 anos de existência. Apresentei alguns nomes que contribuíram para o surgimento do Cinema, desde Louis Le Prince, inventor de uma das primeiras câmeras cinematográficas, passando pelos Irmãos Lumière, responsáveis pela primeira apresentação pública de um filme, evento ocorrido em 28 de dezembro de 1895, chegando a Georges Méliès e Alice Guy Blaché, que produziram e dirigiram uma quantidade incrível de filmes a partir de 1896, muitos obtendo considerável sucesso, como “Viagem à Lua” (Le Voyage dans la Lune,1902), de Méliès, e “O Cair das Folhas” (Falling Leaves, 1912), de Blaché. Mas… Além da quantidade significativa de filmes produzidos por Méliès e Blaché, quais foram os principais acontecimentos envolvendo a produção cinematográfica nos anos que sucederam à primeira apresentação de cinema? Onde estavam Chaplin, Keaton, Lloyd, Swanson e Valentino?
Nas telas, a vida cotidiana e o Cinema Narrativo
O chamado Primeiro Cinema corresponde às produções cinematográficas entre os anos de 1895 e 1910, sendo que as primeiras filmagens consistiam, basicamente, de cenas do cotidiano, como no filme “A Saída da Fábrica” (La Sortie de l’Usine Lumière à Lyon, 1895), dos irmãos Lumière, em que vemos vários trabalhadores saindo da fábrica pertencente aos próprios irmãos, e paisagens, como em “Vista da Baía de Guanabara”, primeiro filme brasileiro da história, filmado por Afonso Segreto em 1898.
Contudo, já em 1896 surge o Cinema Narrativo, caracterizado pela construção de imagens para se contar uma história, como se vê no filme francês “O Solar do Diabo” (Le Manoir du Diable”, 1896), de Georges Méliès, sendo este considerado o marco do Cinema Narrativo, estando, também, na vanguarda da utilização de elementos fantasiosos, ao ponto de ser creditado como o primeiro filme de terror da história.
Filmes retratando o cotidiano continuaram a ser produzidos, como também os narrativos, os quais obtiveram maior sucesso de renda e público já nesta primeira fase do Cinema, com destaque para “O Grande Roubo de Trem” (The Great Train Robbery, 1903), considerado o primeiro faroeste da história, de Edwin S. Porter; o australiano “The Story of the Kelly Gang”, de Charles Tait, sendo este o primeiro longa-metragem a ser exibido, tendo aproximadamente 70 minutos de duração; e o já mencionado “Viagem à Lua”, de Méliès.
Grande parte dos filmes produzidos era exibida em pequenas salas adaptadas conhecidas como “Nickelodeons”, cujo termo possui referência ao preço da sessão (cinco centavos de dólar ou cinco níqueis) e ao “odeon”, um tipo de teatro da Grécia Antiga, o qual era utilizado para citação de poemas em tom elevado e solene (os odes). Os Nickelodeons consistiam em uma forma menos custosa para assistir a diversos filmes em uma única sessão, sendo frequentados, em sua maioria, por trabalhadores e imigrantes.
Em paralelo ao alastramento dos Nickelodeons, cuja audiência ultrapassou dois milhões de espectadores em 1907, também despontavam as salas de cinema por todo o mundo, sendo que já na primeira década do Século XX foram inauguradas as primeiras salas fora do eixo França-EUA, países que dominavam a indústria cinematográfica da época, como no caso da Finlândia (1901), Japão (1903), Dinamarca (1904), Inglaterra (1905), Islândia (1906) e Irlanda (1909).
Há que se registrar que nas salas de cinema, desde a primeira exibição de um filme ao público, transcorria em paralelo à obra cinematográfica o acompanhamento musical ao vivo ou através de trilhas sonoras executadas de forma sincronizada. Na primeira exibição, de 1895, havia um pianista, cujo nome permanece desconhecido até os dias atuais.
Um novo olhar
Há que se registrar que após todo esse “boom” de propagação da sétima arte, o Cinema ainda obteve um forte aliado em virtude de uma greve dos artistas de teatro, que protestavam quanto aos baixos salários, à falta do pagamento destes e ao fim dos benefícios, situação que se agravou com a extensão da carga horária de trabalho.
A greve, conhecida como “A Greve do Music Hall de 1907” (Music Hall Strike of 1907), durou apenas duas semanas, mas foi o suficiente para que as reivindicações dos artistas fossem atendidas em sua plenitude, como também para que suscitassem reflexões sobre a natureza do entretenimento.
Os artistas passaram a questionar o amplo controle dos donos dos teatros sobre as obras que contracenavam, enquanto o público em geral, por conta da ampla divulgação da greve, voltou o seu olhar para outras formas de entretenimento, o mesmo ocorrendo com os donos de teatros, que, além de carregarem o peso da repercussão negativa de uma greve, somada aos reveses logrados, sentiram-se pressionados a procurarem outras formas de entretenimento, encontrando nas “imagens em movimento” uma boa opção.
Desse modo, a indústria cinematográfica se atentou para o fato de que o Cinema poderia alcançar um público mais amplo que o teatro e sem as limitações estruturais que este último possuía.
Apesar dos avanços obtidos antes da greve do Music Hall, pois já existiam as grandes produtoras cinematográficas, como as francesas Pathé Frères, que já no início da década de 1900 chegou a ser a maior produtora do mundo, e Gaumont, que antes do final daquela década superaria a Pathé, além das estadunidenses Biograph Company, Vitagraph Company of America e a Edison Studios, do inventor e empreendedor Thomas Edison, os anos posteriores à greve experimentariam avanços significativos no campo cinematográfico.
Conquistando os ricos
Em 1908, é criada em Paris a produtora de filmes Le Film d’Art, tendo como objetivo produzir filmes de melhor qualidade para atingir a camada mais instruída da população. Para tal, foi colocada em prática a ideia de se produzir obras literárias protagonizadas por consagrados atores de teatro, cuja ação, além de cumprir os propósitos da produtora, culminou no aumento da produção de longas metragens e, por conseguinte, na elevação dos preços de venda dos ingressos.
Nesse mesmo ano, nos EUA é criada a MPPC – Motion Pictures Patents Company, um fundo de todas as principais empresas cinematográficas dos EUA e filiais estrangeiras locais, cujo intuito era atingir as classes mais abastadas. Nesse sentido, a MPPC procurou padronizar a forma de distribuição e exibição dos filmes nos EUA, melhorando a qualidade destes através da competição interna, como também desestimulou o uso do financiamento externo, acabando com a dominação dos filmes estrangeiros, além de monopolizar a produção cinematográfica local.
Ainda que despropositadamente, a imposição dos padrões aos produtores não associados, sobretudo aos independentes, os quais rejeitavam veementemente as regras da MPPC, contribuiu para que tais produtores começassem a rodar os seus filmes na Costa Oeste dos EUA, cuja ação resultaria no surgimento do maior centro cinematográfico do país.
Preparando o terreno para os que viriam
Durante o período denominado de Primeiro Cinema, vários acontecimentos e situações contribuíram para a evolução da produção de filmes, alguns relatados neste artigo. Contudo, vale destacar os trabalhos realizados no campo tecnológico, sendo que alguns somente se concluiriam nas décadas seguintes, mas que modificariam a concepção de Cinema de forma perene, como a criação do sistema de cor denominado Kinemacolor, de G.A. Smith, primeiro processo bem-sucedido na criação de imagens coloridas, e os primeiros trabalhos procurando inserir o som na película cinematográfica, como os do inventor sueco Sven Berglund, cujos estudos se baseavam num sistema de gravação de som em película através de um processo óptico.
Quanto aos nomes citados no início deste artigo, todos se encontravam fora da indústria cinematográfica, pois iniciariam suas carreiras nas telas no período seguinte ao “Primeiro Cinema”, conhecido como “Cinema Clássico de Holywood”, tendo o seu início em 1910 e se estendendo até meados dos anos de 1960. Dentre os citados, Harold Lloyd foi o primeiro a participar de um filme (The Old Monk’s Tale , 1913), enquanto Charlie Chaplin realizaria a transição do Vaudeville para o Cinema ao interpretar um estiloso vigarista no filme “Carlitos Repórter” (Making a Living, 1914).
Na entrada do século XX, o Cinema se apresentava como uma forma acessível de entretenimento, atraindo um público constituído, em sua essência, de trabalhadores e imigrantes, e ainda na primeira década, o Cinema passou a atrair a atenção das classes mais altas, mas o que de fato ocorreu foi a universalização da sétima arte, que acabou conquistando todas as camadas sociais em todos os cantos do mundo.
*O texto é de livre pensamento do colunista*




