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Coluna Letrados/Curiosidade do rock
Por: Giovandre Silvatece – Roteirista
Olá, leitor(a) da coluna Letrados! No dia 24 deste mês de abril completam-se 50 anos do falecimento do líder da banda Badfinger, Pete Ham. Como ele faria 28 anos três dias após a sua morte, Ham acabou entrando para o seleto, porém funesto, grupo de artistas que nos deixaram aos 27 anos de idade, como no caso de Janis Joplin, Jimmi Hendrix e Jim Morrison.
Contudo, o que nos chama a atenção foram as circunstâncias que envolveram a morte de Ham, e que ecoaram até a morte de outro integrante da banda, Tom Evans, configuraram-se numa verdadeira tragédia sem precedentes no mundo da música.
Badfinger e a sua formação clássica
Badfinger foi o nome dado a uma banda de rock britânica formada em 1965 no País de Gales, batizada, inicialmente, como The Iveys, tendo gravado um álbum sob essa denominação. A formação original contava com diversos integrantes que foram entrando e saindo da banda, até chegar à formação clássica, tendo Pete Ham nos vocais e guitarra, Tom Evans, vocais e baixo, Joey Molland, guitarra, e Mike Gibbins na bateria. Após a morte de Pete Ham, outros músicos foram recrutados para compor a banda, até o seu fim em 1983.
A banda emplacou diversos sucessos nas décadas de 1960 e 1970, como “Day After Day”, “No Matter What”, e a canção que posteriormente se transformaria num clássico na voz de Harry Nilson, “Without You”.

Ainda como The Iveys, a banda chegou a gravar “Maybe Tomorrow”, álbum lançado em 1969 e produzido pela Apple. O disco não fez o sucesso esperado, sendo que algumas gravações foram recicladas e inseridas naquele que seria o primeiro álbum da banda com a denominação Badfingers: o “Magic Christian Music”, que também incluía músicas inéditas.
Dentre as músicas inéditas do álbum, estava “Come and Get It”, composta e produzida por Paul McCartney, sendo esse o primeiro sucesso internacional do Badfinger. A partir de então, a banda seguiu lançando álbuns continuamente aclamados pelo público e crítica, conseguindo obter boas vendagens e emplacando diversas músicas nas paradas de sucesso dos Estados Unidos e Reino Unido, como em diversos outros países.
Já no final dos anos de 1960, Badfinger não mais se caracterizaria como uma banda de rock promissora, mas sim como uma banda, musicalmente, bem-sucedida. Frisa-se: musicalmente, pois financeiramente as coisas começariam a desmoronar já na primeira metade da década seguinte.
Sucesso e finanças caminhando em direções opostas
Enquanto o sucesso da banda Badfinger parecia não ter fim, o dinheiro recebido pelo grupo em virtude de seu trabalho não correspondia, nem de longe, à altura da fama que a banda alcançara.
A partir de 1969, em face da iminente falência da Apple Records, Allen Klein, empresário que na época gerenciava a carreira dos Rolling Stones, passou, também, a gerir a Apple Records, empresa criada para cuidar das finanças dos Beatles, sendo que Badfinger foi a primeira banda contratada pela Apple, tendo produzido os seus cinco primeiros álbuns.
Apesar da administração agressiva por parte de Klein, tendo realizado a maior demissão em massa da indústria fonográfica, ele conseguiu, por um breve período, tirar a empresa do atoleiro financeiro que se encontrava, entretanto, o seu método de administrar os negócios foi fortemente questionado por McCartney, sendo considerado um dos motivos da separação dos Beatles. Apesar do sucesso inicial de Klein, em 1972 a Apple voltaria a correr o risco de falência, o que prejudicou o lançamento do último álbum do Badfinger. Tal fato culminou na assinatura com a Warner Bros. Records para a produção de seus próximos discos.
Os contratos assinados com a Apple e, posteriormente, com a Warner, culminaram numa série de embrolhos financeiros e judiciais que muito prejudicaram as finanças da banda, contudo, em meio à confusão instaurada, havia um outro elemento que influenciaria no rumo dos integrantes da banda de forma dilacerante.
O fator “Stan Polley”
Stanley Herbert Polley foi um empresário e advogado estadunidense atuante na indústria fonográfica nas décadas de 1960 e 1970. Em 1968, ele criou a empresa Five Arts Management no intuito de agenciar diversos artistas da época, como o cantor Lou Christie e o músico Al Cooper.
Em 1970, Polley criou a Badfinger Enterprises, Inc., entidade corporativa destinada a gerir os recursos provenientes dos trabalhos realizados pela banda Badfinger. Através dessa empresa, Polley negociou para a banda um contrato de três álbuns com a Warner Bros. Records, a qual fez diversos adiantamentos em uma conta caução administrada por ele.
Desde o início do gerenciamento dos valores recebidos pela banda, Polley incentivou os seus integrantes, em conjunto com as suas famílias, a viverem em comunidade, provavelmente para que eles passassem a ter um baixo custo de vida, como também a realizarem shows de forma quase que ininterrupta, gerando, invariavelmente, altos ganhos financeiros, os quais, segundo Polley, seriam aplicados em equipamentos e em publicidade para a banda, em vista disso, o empresário repassaria aos integrantes da banda valores bem abaixo dos ganhos obtidos.
Não demorou muito para que a estratégia utilizada por Polley passasse a ser questionada pelos integrantes da banda, exceto quanto a Pete Ham, que frequentemente o defendia das acusações e desconfianças dos demais membros do grupo. Ham depositara total confiança em Polley, sustentando, assim, a permanência deste como empresário da banda.
A confiança de Pete Ham em Polley sobreviveu mesmo após este último ter sido citado no Senado dos Estados Unidos como intermediário de criminosos não identificados, sendo que, posteriormente, foi comprovado que diversas transações financeiras de Polley eram irregulares e prejudiciais aos seus clientes.
Mesmo durante às investigações do Senado, boa parte dos clientes de Polley, que já suspeitavam de suas práticas criminosas, romperam as relações com ele, o que não ocorreu com o Badfinger, pois Polley continuava a administrar a carreira de seus integrantes.
Contudo, no final do ano de 1974, assim que se confirmaram as falcatruas e os negócios para lá de obscuros de Polley, a Warner exigiu o dinheiro do adiantamento (aquele depositado na conta caução) de volta, entretanto o dinheiro havia “desaparecido”, tendo sido, na realidade, utilizado por Polley numa série de falcatruas envolvendo empresas de fachada.
Restou à Warner processar Polley e a banda. Para piorar a situação, a gravadora deixou de promover o recém-lançado álbum “Wish You Were Here”, como também parou toda a distribuição internacional dos discos e músicas da banda, tolhendo, por completo, a carreira da banda.
O Badfinger tentou dar continuidade à sua carreira, mas nenhum outro empresário quis agenciar o grupo devido aos processos judiciais envolvendo a Badfinger Enterprises, Inc..
A morte de Pete Ham
Nos meses que seguiram à ação da Warner, Pete Ham tentou, a todo custo, entrar em contato com Polley, mas não obteve êxito, o que acabou desencadeando no músico um estado depressivo e de automutilação, pois, segundo os amigos próximos, Ham passou a apagar a ponta dos cigarros em seu próprio corpo. De certo que Ham sentia-se responsável pelo ocorrido devido à sua insistência em manter Polley como empresário da banda, a despeito de todas as desconfianças dos demais integrantes da banda.
No dia 23 de abril de 1975, Pete Ham recebeu um telefonema da justiça estadunidense informando que todo o seu dinheiro havia desaparecido. Na noite daquele dia, Ham e Tom Evans tiveram uma noite de bebedeira. Já de madrugada, Evans deixou Ham em sua casa. Pouco tempo depois, Pete William Ham se enforcou em seu estúdio que ficava na garagem de sua casa. Ele deixou um bilhete para Anne Herriot, sua namorada que estava grávida de oito meses, e à sua mãe, Blair, além de uma ácida menção à Stan Polley:
“Anne, I love you. Blair, I love you.
I will not be allowed to love and trust everybody. This is better.
Pete
P.S. Stan Polley is a soulless bastard. I will take him with me”.
–
Anne, eu te amo. Blair, eu te amo.
Não foi permitido a mim amar, e confiar em todo mundo. Assim é melhor.
Pete.
Obs: Stan Polley é um bastardo sem alma. Eu o levarei comigo.
A filha de Pete Ham, Petera Ham, nasceria exatamente um mês após a sua morte.
Nova tragédia
Após a morte de Ham, a banda se dissolveu. Os demais integrantes formaram outras bandas, que não deram certo, dessa forma, já em 1977, Joey Molland e Tom Evans encontravam-se fora do ramo musical. Completamente falidos, Molland chegou a dar graças a Deus por possuir várias guitarras para vender, tendo que morar com os pais da esposa por não conseguir se sustentar instalando carpetes, enquanto Evans chegou a trabalhar como motorista de taxi.
Apesar dos percalços, Molland e Evan conseguiram “ressuscitar” o Badfinger recrutando outros músicos, tendo lançado dois álbuns. Contudo, após o fracasso do segundo álbum (Say No More) a banda se dividiu, com Molland e Evan possuindo duas bandas rivais sob a mesma denominação Badfinger, o que os levou a discussões acaloradas relacionadas ao direito de usar essa nomenclatura. Por fim, Molland conseguiu impedir que Evans utiliza-se o nome da banda.
Pouco tempo depois, Evans tentou convencer Molland para que pudesse utilizar o nome Badfinger, pois, além de ter assumido vários compromissos financeiros, ele havia assinado contratos que obrigavam a sua banda se apresentar como Badfinger, entretanto, acabou recebendo um “não” como resposta, abalando ainda mais o seu estado emocional que já vinha se deteriorando desde à época dos desfalques de Polley.
Ante o quadro de depressão que havia acometido a Evans, no dia 19 de novembro de 1983, o seu filho Stephen aproximou-se de sua mãe (Marianne Evans) e disse que havia um homem pendurado numa árvore do quintal de sua casa muito parecido com o pai dele.
Depois de tudo
Após o suicídio de Tom Evans em 1983, os integrantes remanescentes chegaram a fazer algumas apresentações e turnês sob a denominação Badfinger, como também seguiram em suas carreiras solo.
Em 4 de outubro de 2005, o baterista Mike Gibbins, aos 56 anos, morreu após sofrer um aneurisma cerebral enquanto dormia. Joey Molland, o último integrante da formação clássica do Badfinger, morreu no dia 1° de março deste ano de 2025, aos 77 anos. Molland já vinha enfrentando problemas de saúde nos últimos anos, incluindo pneumonia e complicações originárias da diabetes.
Quanto a Stan Polley, responsável direto pelo caos financeiro que ele mesmo impôs aos integrantes da banda Badfinger, ainda se envolveu em mais falcatruas, tendo ele mesmo se considerado culpado depois de extorquir 250 mil dólares de um engenheiro aeronáutico, ficando em liberdade condicional por cinco anos. Polley morreu em 2009, aos 87 anos.
Diversas foram as situações em que o responsável financeiro de uma banda foi acusado de roubo e extorsão, como aconteceu com o Pearl Jam, em que o diretor financeiro Rickey Charles Goodrich admitiu ter roubado 380 mil dólares da banda, e com o Grateful Dead, que em 1971 conseguiu prender o seu empresário que lhe roubara 70 milhões de dólares, além de diversos outros casos. Contudo, nada foi tão arrasador como aconteceu com a banda Badfinger. Os seus integrantes ficaram, literalmente, falidos.
O que se extrai dessa história é o quanto a indústria fonográfica pode ser cruel com os seus artistas. A despeito de todo o mal causado por Polley, a partir do momento em que a gravadora tomou conhecimento de suas trapaças, ela não fez distinção entre aquele que lesou e aqueles que, assim como ela, também foram lesados, processando e punindo a ambos. Para os artistas que fazem parte desta indústria, fiquem espertos!
*O texto é de livre pensamento do colunista*
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