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A trajetória educacional dos negros no Brasil

Educação, uma questão de cor

A história da educação e escolarização dos negros e negras, no Brasil, foi marcada por uma caminhada de desigualdades político-econômico-social que se verifica até os dias atuais. Vamos refletir sobre a trajetória e luta pela educação dos negros no Brasil, desde o período colonial até a nossa contemporaneidade.

Questiona-se como os avanços legais contribuíram para a inclusão e valorização da população negra na educação. Verifica-se que os avanços legais foram, e, são significativos para a ascensão representativa do negro na educação, no entanto, ocorreram de modo tardio, e, ainda não se tornam o suficiente para reparar séculos de exclusão.

Por muitos anos, a população negra se manteve exclusa nas representatividades do universo educacional, aqui nos cabe o questionamento: Como os avanços legais contribuíram para a inclusão e valorização da população negra na educação?

Nesse sentido, no presente artigo, abordaremos o quanto que as Leis de Diretrizes e Bases (LDB) da educação nacional foram importantes e quão tardias foram sancionadas.

Em 2003, entrou em vigor a Lei 10.639/03, que oficializa o dia 20 de novembro como “Dia Nacional da Consciência Negra”, e que torna obrigatório o ensino de Cultura Afro-brasileira na grade curricular do ensino fundamental e médio. Após nove anos, em sequência a inclusão da real face brasileira, foi sancionada a Lei 12.711/12, que abre as portas de acesso à educação superior, não só tornando a população negra representada através de sua história e cultura, todavia, os reposicionando em um novo patamar legítimo: o de protagonistas e produtores do seu próprio conhecimento, garantindo a estes, o acesso às universidades públicas e privadas, através das cotas raciais.

Esses avanços educacionais citados surgiram através de mais de um século de lutas, deste modo a referente pesquisa mostra como a educação sempre foi um produto social, da qual a cor da pele é um fator determinante e limitante no tocante ao acesso social/educacional. Através das lutas se chegaram as bases legais que modificaram a participação da população negra dentro da educação, dando a estes maior espaço.

As fronteiras do possível: a luta pela escolarização/educação dos negros nos tempos de escravidão.

A educação se configura como um projeto político de um país, podemos verificar suas variáveis ao longo da história brasileira. Ghiraldelli (2001) apresenta a história da educação brasileira como um projeto político disputado pelos interesses das classes sociais. E a rigor, a classe hegemônica coloca em evidência seu projeto educacional, apresentando-se como consenso para o ideal de Nação.

Desde o período da chegada dos portugueses às terras brasileiras, a educação se construiu como uma importante ferramenta para formação de um tipo de sociedade. A educação oferecida no Brasil Colônia, por exemplo, tinha como objetivo a modelação dos povos nativos para se adequar aos modos europeus e incluí-los em uma lógica de trabalho escravizado, bem como destinava-se a trazer novos fiéis para o catolicismo. Já a educação destinada aos colonos se direcionava para a preservação dos valores morais e religiosos. Ao passo que, excluíam-se os escravizados.

No Brasil Império, quando as escolas se propagam, ainda assim não existiam escolas formais para negros/as e/ou apoio governamental que permitissem seu ingresso, diferentemente de outros países como os EUA. País esse que o racismo era explícito na separação de escolas para negros e escolas para brancos.

Mesmo a educação sendo negada aos escravizados, as formas de resistências dos negros tornaram fartas. Sendo assim, já no Brasil Império, se verifica a existência de escolas informais para negros.

Santos (2013) cita a antropóloga Irene Maria Ferreira Barbosa, da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo, que aborda sobre um dos mais antigos registros da escolarização dos povos negros, que foi através da escola do Professor Antônio Cesarino, situada em Campinas no interior de São Paulo, que funcionou de 1860 a 1876.

O professor Cesarino e suas irmãs eram filhos de um escravo alforriado – ato pelo qual um proprietário de escravos liberta os seus próprios escravos por meio de um documento chamado ‘carta de alforria’.  Esse escravo alforriado vendeu sua tropa de mulas para que seu filho pudesse estudar. Cesarino frequentou uma escola para brancos e conseguiu se formar, posteriormente passou a lecionar junto com suas irmãs e esposa.

A escola que Cesarino fundou era para meninas brancas. Elas aprendiam a ler, escrever, a resolver as operações matemáticas e regras de etiqueta, além de costurar, bordar, cozinhar etc. Com a mensalidade paga pelas meninas brancas, que estudavam no diurno, Cesarino oferecia gratuitamente a escolarização para moças negras no período noturno. (Santos; Oliveira; Oliveira; Gimenes, 2013).

Além da escola de Cesarino há registros não tão aprofundados da escola de Pretextato, sendo esta a primeira escola para negros existentes no Brasil. A escola funcionou de 1853 a 1873, situada no Rio de Janeiro. Segundo a historiadora Adriana Maria Paulo da Silva (2002). Pretextato era homem negro e não se sabe como conseguiu alfabetizar-se, e abriu processo licitatório à corte, Eusébio de Queiroz para funcionamento de sua escola, que atendia em média de quinze alunos pobres, os quais não possuíam se quer sobrenome.

Esses negros que a duras penas conseguiram ingressar nas escolas eram um grupo restrito de negros livres ou libertos. Conforme o decreto 7031 de 06 de setembro de 1878 só podia se matricular pessoas do sexo masculino, maiores de 14 anos livres ou libertos, saudáveis e vacinados. Deste modo fica evidente a exclusão das mulheres negras e escravos, visto que para estes era impossível executar trabalhos de longas jornadas e ter o “luxo” de aprender a ler e escrever.

Diante desse contexto histórico pode-se perceber que a escolarização se tratando de povos negros nasceu diante de uma disparidade da qual vem sendo refletida ao longo dos anos. Percebe-se que a educação no Brasil, desde o seu princípio preocupou-se em atender as necessidades dos homens da classe dominante branca, segregando a população negra do acesso e da produção intelectual.

O que encontramos na história da escolarização dos negros, até o início do século XX, são casos isolados, produtos de algumas resistências e lutas, como essas experiências de Cesarino e Pretextato. Ainda podemos falar sobre a “Imprensa Negra”, como um fator importante da luta pela educação, fugindo dos espaços escolares formais que eram negados.

Lutas contra a escravidão: ‘Imprensa Negra’, ‘Lei Áurea’ e ‘Cotas Raciais’.

O final do século XIX, o Brasil é marcado pela efervescência em defesa ao abolicionismo, e nesse período, já existia uma grande parte da população negra livre. A Impressa Negra, que foi assim chamada por denunciar a escravidão e incentivar o abolicionismo, nasce aí. Segundo Fraga e Albuquerque (2009, p. 87-88) nesse período a imprensa literária brasileira passa a contar com a participação de autores negros. Entre esses autores é possível citar o renomado Machado de Assis (1839-1908).

Machado de Assis foi um marco na literatura brasileira e no aparecimento da Imprensa Negra. Por ser negro e pobre, sua infância foi dívida entre os estudos e trabalhos, estudos esse que ocorreram de maneira informal, sendo alfabetizado na prática da leitura e escrita dentro de sua casa. Logo cedo começou a trabalhar como aprendiz de tipógrafo, onde ganhou notoriedade por seus escritos, ganhando espaço na sociedade letrada e reconhecimento de suas obras. Na sua própria trajetória notamos também a luta pela escolarização.

A Imprensa Negra teve um papel primordial na manifestação pública contra a vida segregada dos negros, e com a crítica da “opressão branca”. O surgimento da Imprensa Negra abre espaço para novos movimentos sociais que marcam o início e final do século XX.

As críticas quanto ao sistema de cotas por parte de grandes instituições de ensino superior decorriam da justificativa de que a abertura de vagas para negros, índios e alunos de baixa renda desvalorizaria tais instituições. No entanto sabendo que a educação é um produto de ascensão social do indivíduo, aonde as classes desfavorecidas têm a oportunidade de terem suas vidas equiparadas, a políticas de cotas se faz importante para a ruptura das barreiras educativas e sociais, conforme Bezerra:

“Se as pessoas não são iguais, não receberão coisas iguais. A parte desta certeza devemos entender que precisamos tratar os desiguais de forma diferenciada para que possamos, enfim, alcançar a almejada isonomia. Ou seja, diante de tal imperativo não basta o Estado adotar uma ação neutra, mais que isso, veda-se ao Estado a prática de ações ou projetos que versem sobre a criação, promoção ou execução de discursos e condutas que tenham por essência a cultura da desigualdade e de outros mecanismos de discriminação e exclusão”. (BEZERRA, 2016).

As cotas raciais, enquanto política pública, têm esta finalidade, de fazer o Estado participativo do desenvolvimento educacional e social do indivíduo, assim como é declarado no Art. 205 da Constituição Federal de 1988.

Se tratando de educação brasileira podemos mencionar os avanços legais extremamente importantes que servem para equiparar a população negra, que por muito tempo esteve excluída e sem direitos educacionais. Vemos que o acesso à educação foi historicamente negado a população negra, e quando a partir de lutas se conquistou esse direito, outra batalha se intensificou: trazer ao cenário educacional a representatividade negra na valorização da cultura e história africana e afro-brasileira.

A liberdade garantida através da Lei Áurea, em 13 de maio de 1888, não trazia medidas de equidade social entre negros e brancos, os negros foram “jogados” dentro de uma sociedade desenvolvida, sendo obrigados a buscar sua subsistência de maneira totalmente precária.

Embora com todo empenho empregado constata-se que ainda existe um ‘gap’, e o alcance apenas fracionado das ações afirmativas, exigindo do Estado uma atuação efetiva, quanto a forma de políticas públicas, bem mais direcionadas a promoção da igualdade das oportunidades no acesso ao ensino superior público. Mesmo com as críticas, o fato é que as ações afirmativas têm sido a única oportunidade de acesso ao ensino superior para grande parte da população negra, que passados tantos e tantos anos da abolição da escravatura, ainda precisa ter que conviver com o preconceito e a negação dos seus direitos, mesmo os básicos.

 

*O texto é de livre pensamento do colunista*


Samuel J. Messias – *Mestre em Educação ( Florida University- USA) – *MBA em Estratégia Empresarial – *Especialista em Políticas Públicas – *Especialista em PNL – *Especialista em Empreendedorismo Circular – *Gerente de Projetos Especiais na ADERES – *Prof. Convidado na Florida University – USA.

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