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Entrevista / Atleta
Por José Salucci – Jornalista e diretor do Merkato
Ele tem um coração gigante, semelhante ao seu talento e experiência em duas artes marciais: jiu-jitsu e grappling. Em maio deste ano, consagrou-se campeão mundial nessas duas modalidades. Na ocasião, disputou a Copa do Mundo de Artes Marciais, em Buenos Aires, Argentina. Do país dos Hermanos, ele trouxe cinco títulos para o Brasil, consequentemente para o esporte capixaba. Pôde disputar o Mundial porque em abril deste ano, também foi campeão na 16ª edição do Campeonato Brasileiro de Esportes de Contato 2024, que aconteceu, em São Torquato, Vila Velha. Esse campeonato serviu de seletiva para o Mundial.
Na entrevista, esse rapaz simpático, alegre, bom moço, mas com um nome muito estranho (risos do jornalista), resolveu abrir sua vida íntima, profissional e espiritual. A conversa tratou de empreendedorismo no esporte, o qual ele executa muito bem, com o seu projeto, o OFC – Oliveira Fight Combat -, falamos dos títulos conquistados na Argentina, família, propósito de vida, trabalho e, claro, não poderia faltar um papo de romance. Lindo demais a história desse homem apaixonado pela Karla, sua esposa, e pelos seus dois filhos: Noah, de 1 ano, e o Gabriel Lucas, de 12 anos.
Conheça um pouco mais da história de Fledis de Oliveira Gonçalves, morador de Colina de Laranjeiras, Serra! O menino que nasceu em Pancas-ES, teve vida humilde, perdeu sua mãe aos 8 anos de idade. Nessa história, resolveu camuflar o nome e passou a ser conhecido como Oliveira. Ufaaaaaa! Bem melhor! Oliveira é a árvore que produz a oliva, que dá azeitona. Pra azeitona produzir o azeite, ela precisa de ser esmagada, essa Oliveira foi. A simbologia da oliveira denota paz, fecundidade, glória e vitória. Precisa de dizer mais alguma coisa? Apenas leia a história de um campeão.
1 – Oliveira, muito obrigado por ceder essa entrevista. Me conta um pouco de você: histórias da infância, primeiro esporte que começou a praticar entre outras curiosidades.
Eu nasci em 14 de fevereiro de 1986, na cidade de Pancas-ES. Morei no Córrego da Alegria, no meio do mato. Ali, eu batia enxada, colhia café, virava masseira para o meu pai, ele era pedreiro. Morávamos na roça… Meu irmão andava 12 quilômetros pra chegar à escola. Aí meu pai leva a gente pra Pancas, ele comprou uma casa… No primeiro ano estudando, no segundo ano minha mãe morre, eu tinha 8 anos, foi aquele caos. Morando na cidade, vulnerabilidade social, droga, bebida, eu via brigas, que algumas acabaram em homicídio, eu vi tudo isso próximo de mim, nunca tinha visto isso na vida e agora sem mãe para me orientar.
Então, no ano do falecimento da minha mãe, em 1994, era tempo de Copa do Mundo, o Brasil foi tetra campeão num momento de muita tristeza da minha vida, eu vi o Brasil ser vitorioso e as pessoas felizes, então foi quando eu quis ser jogador de futebol pra poder gerar uma alegria pro povo brasileiro, pro meu pai e minha família, que tinham perdido a minha mãe.
No esporte, o futebol foi minha primeira modalidade. Joguei Copa A Gazetinha; Copa Norte; campeonatos da cidade, que até fui campeão e me destaquei como artilheiro; joguei futebol de salão, participei de um campeonato de beach soccer em Vitória, junto com Duda, o Bruno, joguei a Copa Metropolitana e alguns municipais, mas já estava perdendo o interesse e, quando via o vigor físico dos jogadores, aí vi que não conseguia mais.
Aos 18 anos comecei a trabalhar, já namorava e queria casar, muita responsabilidade… Fui deixando de treinar futebol, perdendo o vigor físico, já não tinha mais tanto interesse nesse esporte, acabei deixando o sonho de ser jogador.
2 – O que o futebol te amadureceu para a prática do esporte de luta?
O comprometimento com o treinamento. No futebol, eu não fui muito profissional, porque eu não fui mais comprometido. Eu cheguei a pegar um certo talento, achei que estava bom e parei de evoluir. Naquela época, achei que o que eu tinha aprendido até o momento dava pra ser profissional. Hoje, com a luta, eu não cometo esse mesmo erro. Na luta eu quero aprimorar cada vez mais. No futebol, eu cheguei em um patamar de ser o camisa 10 do time, então pensei que não precisava de evoluir.
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3 – Futebol x jiu-jitsu, qual a diferença?
Eu conheci o jiu-jitsu eu tinha 28 anos, já morava em Vitória, na Ilha do Príncipe. Posso te dizer que o jiu-jitsu me deu algumas coisas que o futebol não me deu. O futebol não tem honra. O futebol ensina uma coisa muito dura: se você é pior que o seu adversário, é necessário partir pra agressão. Já o jiu-jitsu, é totalmente diferente: ensina o respeito.
No jiu-jitsu o seu professor ensina a disciplina. Você respeita o seu adversário por ele ser melhor e vai treinar mais pra ser melhor o quanto ele é, já no futebol te ensinam a chutar o adversário, dar cotovelada. Eu ia pro futebol pra desestressar e voltava mais estressado, ficava agressivo, era aquele estilo Felipe Melo.
Ao contrário, o jiu-jitsu foi me trazendo uma paz, uma temperança que o futebol nunca me deu, então passei a me dedicar ao jiu-jitsu, que me deu uma nova visão de ser humano. Eu era muito reativo, o jiu-jitsu me ensinou a me controlar. Eu não sei o que discutir com alguém a quase 8 anos, xingar, brigar, até o meu relacionamento com a minha esposa melhorou.
4 – Agora mudando de assunto, vamos falar de romance. Como conheceu a Karla, sua amada esposa?
Conheci a Karla no retiro da igreja, eu de Pancas e ela da Ilha do Príncipe, em Vitória. Aí eu vejo uma loirinha de olho verde, a gente troca olhares… Depois começamos a conversar. À época, eu tinha feito um propósito com Deus de fiar um ano de corte (não ter relação afetiva com nenhuma menina até encontrar minha esposa). Então, encontrei a Karla, e naquele retiro, a gente começou a orar. Temos 18 anos de casado, ao todo 20 anos juntos. Ela é parceira de medalha de ouro; por aguentar esses sonhos malucos que eu tenho de competição; as preparações; as dietas, que acabam me deixando estressado; quando chega perto de competição a gente acaba ficando ansioso e ela suporta.
5 – E seu trabalho, antes de se tornar atleta, por quais lugares passou?
Eu comecei a trabalhar em Pancas numa loja de móveis e eletrodoméstico, a Ronan Móveis, posteriormente, fui trabalhar em outra loja chamada Castelar, o Edmar era dono. Foi ele que fez a transição da minha vida de entender que o interior não era pra mim.
Um belo dia, chego pra trabalhar e, simplesmente, ele me desliga da empresa. Eu chorei muito! Era recém casado; ganhava bem. Perguntei pra ele: “Você é louco, rapaz? Por que você tá fazendo isso comigo? Como é que eu vou falar pra minha esposa? Ele virou pra mim e disse: “Aqui não é seu lugar. Você é maior que isso aqui. Vai embora de Pancas”, ele ainda me disse: “Você tem sonhos muito maiores, aqui não é lugar pra você”. E aí, eu fui pra casa contar pra minha esposa, fui à igreja pra orar, chorar, e aí entendi esse recado e resolvi ir pra Vitória.
Chegando na capital fiz curso de vigilante, fiz o curso de Segurança Patrimonial na CTPS. Trabalhei no Ilha Shows como segurança, na VSG. Me destaquei em todos os lugares que trabalhei, e foi nesse tempo que a fixa caiu das palavras que o Edmar me disse. Foi nessa época que ao invés de ser chamado de Fledis, que eu comecei a usar o meu sobrenome: Oliveira. Assim como na bíblia alguns personagens tiveram seus nomes mudados e pós isso também tiveram novas vida transformadas, como por exemplo, Saulo, virou Paulo; Jacó, passou a ser chamado de Israel, eu de Fledis, passei a ser respeitado com o nome Oliveira, porque também trabalhei no sistema prisional, aí ninguém iria me respeitar com esse nome.
A história foi o seguinte: meu pai queria me registrar como Júnior e minha mãe, Fred. Aí, eles começaram a brigar. Ninguém sabe como é que meu pai, naquele dia de registrar o meu nome, o que ele falou para o escrivão. Numa briga entre meus pais, que deu empate, e eu que saí perdendo (risos), quer dizer: já nasci num clima de luta. Mas graças a Deus tive meu nome trocado na história da minha vida e tenho um nome de vida e de honra.
6 – E quando a gente fala do jiu-jitsu, quando você começou a levar a sério e querer se tornar profissional?
Eu tinha três empregos, ganhava muito bem em uma dessas empresas, eu estava lá seis meses e do nada eu fui demitido. Fiquei com o tempo ocioso e passei a treinar jiu-jitsu mais focado para tirar aquele momento de tristeza. Isso foi em 2017 na academia do Tião Gomes. A primeira academia que eu treinei foi do mestre Nado, na Praia do Canto, eu treinava só por causa da minha profissão.
Quando eu vim morar em Colina de Laranjeiras, eu estava passando em frente a academia do mestre Tião… e aí ele me chamou pra treinar. Nesse tempo comecei a treinar e ele me colocou pra disputar o estadual, minha primeira competição que disputei e ganhei, me apaixonei naquilo dali. Depois fui disputar um campeonato internacional em Guarapari, fiquei em segundo lugar. Fui me dedicando… Hoje eu tenho 97 medalhas entre outro, prata e bronze, quatro cinturões e cinco troféus.
7 – Já que estamos falando de jiu-jitsu, e a Copa do Mundo de Artes Marciais na Argentina, conta tudo pra gente.
Para participar do Mundial, em Buenos Aires tem uma história. Em 2023, eu ganhei o Brasileiro, a Copa do Brasil e o Sul Americano. Dentre esses dois títulos, um foi no ES e os outros dois em SP. E esse ano, também fui campeão Brasileiro de Esporte de Contato, em São Torquato, Vila Velha, esse campeonato serviu de seletiva para o Mundial na Argentina.
Então, eu consigo boa colocação no ranking durante esse processo. O Portinho, presidente da Federação Capixaba de Esportes de Contato (FECAP-EC), vendo meu desempenho dentro das competições, me colocou dentro da delegação e conseguiu o “VOE Atleta” para eu representar o Brasil. Fomos em numa delegação de 12 pessoas daqui do ES. Eu representei o Brasil no estilo greppling e jiu-jitsu. Enfrentamos muitas dificuldades: falta de dinheiro; muito frio, que nunca tinha sentido na vida, a comida fora da dieta, cheguei a passar mal…
E em relação aos títulos, ganhei dois cinturões e três medalhas de ouro. As medalhas foram no greppling, na categoria até 91kg, até 94 kg e até 100 kg. Os cinturões foram: um no chaveamento até 94 kg e o outro no jiu-jitsu de kimono, categoria até 94 kg. Ao todo, nossa delegação, com 12 atletas, conseguiu 21 cinturões e 35 medalhas. Foi o melhor rendimento do Brasil. Eu trouxe cinco títulos mundiais em cinco categorias diferentes.
8 – O Edmar falou para você ir embora de Pancas. À época, você nem sonhava com esse esporte, muito menos esses títulos. O que tem a dizer?
Eu sou grato pelo Edmar, eu falei isso pra ele. Eu chorei muito quando ganhei esses títulos porque foi muito treinamento… Eu trenei machucado; lutei o Brasileiro machucado, duas semanas antes; fui pra lá sentindo dores no calcanhar; com as duas orelhas estouradas; treinei todo dia sem parar. Eu venci o frio, o medo. Ganhei o “VOE Atleta” pra representar meu país. Então é muita satisfação, porque você passa pela aprovação e avaliação de muita gente, corre muito risco e chega a pensar se vai dar certo. A cobrança é forte, e quando eu ganho cinco títulos em um só campeonato, é uma sensação de dever cumprido.
Naquele momento eu pensei no falecimento da minha mãe, lembrei de quanto o meu pai trabalhou pela família. E saber que você não chega a lugar nenhum sozinho e poder ligar par as pessoas e falar: Dever cumprido, muito obrigado por acreditarem e mim.
9 – O que passou pela sua cabeça durante as lutas? Você perdeu a concentração em alguns momentos?
Uma curiosidade. Antes de entrar na primeira luta, eu estava com muito medo, ansioso, apreensivo e nervoso. A minha esposa fez um vídeo, junto com meu filho, onde aparecia as mensagens de amigos. Eu assisto esse vídeo pedindo a Deus força, eu estava me sentindo sem força naquele momento, antes da primeira luta. Eu senti até vontade de ir embora. Quando eu termino de assistir o vídeo, eu me lembro da minha mãe, da minha infância, das agressões que eu sofri, dos pré-julgamentos que sofri, me lembrei de tudo isso. Eu me levanto e já me senti todo quente por dentro, uma força.
Nesse momento, eu olho pro meu adversário na fila e ele chegou a baixar o olhar. Tinha uma pessoa me observando nesse momento em que eu estava assistindo o vídeo e orando. Ele me disse que foi nessa hora que eu derrotei o adversário, porque ele percebeu a fisionomia do meu rosto antes do vídeo e depois de assistir o vídeo. Eu olhei pro adversário e olhando pra ele eu falei dentro de mim: Ninguém me ganha aqui hoje. Eu sou mais que vencedor! Eu já venci só de estar aqui. Eu olhava pro cinturão e falava dentro de mim: Ele é meu. Comecei a profetizar.
10 – Palavra final: família, títulos na Argentina, esporte e onde você pretende chegar?
Hoje, eu sou um cara, que além de lutar, realizar evento esportivo e ganhar títulos internacionais, pretendo ir no campeonato Europeu de Jiu-Jitsu, em Portugal, 2025. É um sonho que eu tenho de lutar. Sobre a família, eu quero agradecer, pois é a base de tudo. Também me ajudou a lutar os amigos de verdade, como Willian Nunes. Também dizer que, eu vou conquistar muito mais coisas, vou trabalhar, não só como atleta, mas também com eventos esportivos, inserir crianças no esporte, fazer trabalho social e, se Deus quiser, ano que vem, eu vou criar o Instituto OFC – Oliveira Figth Combat, a qual eu quero atender 200 crianças carentes, com várias modalidades esportivas, aqui na região de Laranjeiras, e poder fomentar o que o esporte fez na minha vida. Ele me salvou! Eu quero salvar outras vidas através do esporte e, assim, inserir a palavra de Deus nesse local.
Invista no Jornal Merkato! – Pix: 47.964.551/0001-39